Por Jorge Luiz de Andrade Barros Junior
Nos contratos, há a estipulação de multas e penalidades de toda sorte contra o
consumidor em caso de inadimplemento, e nenhuma contra a construtora ou
incorporadora.
Diante da
crescente expansão imobiliária testemunhada por todos, este artigo tem o
objetivo de ilustrar pontos controvertidos acerca da prática de construtoras e
incorporadoras que, valendo-se da vulnerabilidade do consumidor acabam por
cometer irregularidades que causam enormes prejuízos aos adquirentes.
Danos morais e Materiais pelo atraso da
unidade e da área comum de lazer
Vários
são os problemas constantes nos contratos de adesão apresentados pelas
construtoras aos adquirentes. Por se tratar de contrato de adesão, a negociação
e modificação de cláusulas fica prejudicada, o que provoca uma enxurrada de
ações judiciais com o fim precípuo de discutir e/ou anular tais cláusulas.
O
principal ato danoso praticado é, sem dúvida, o atraso na entrega do
empreendimento. É fato notório que este atraso acarreta uma série de danos aos
adquirentes, tanto materiais quanto morais. O adquirente se programa, se
organiza para ocupar seu bem na data aprazada e acaba sendo surpreendido com a
alteração unilateral da data de entrega deste.
O
consumidor, além de pagar o financiamento, deve arcar, na maioria das vezes,
com gastos de aluguel, até mesmo porque precisa de um lugar para residir com
sua família. Tal situação faz com que a obrigação assumida se torne
sobremaneira onerosa, causando danos materiais com relação aos gastos
mencionados e ao lucro que deixou de obter se tivesse o bem na data aprazada
(lucros cessantes) e morais, já que o desgosto, a sensação de impotência, a
frustração, o receio (por se tratar de investimento de alto valor) e a inércia
das incorporadoras são ensejadores desta modalidade danosa.
Nestes
casos, o que costumeiramente se aplica aos casos concretos é uma indenização a
título de lucros cessantes, ou seja, aquela vantagem que o adquirente deixou de
aferir exatamente por não ter recebido seu bem na data estipulada
contratualmente, consistente no valor que o consumidor pagou em aluguéis ou,
ainda, em valor equivalente ao aluguel do imóvel adquirido.
PROCESSUAL
CIVIL – CIVIL – PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – INADIMPLEMENTO DA
INCORPORADORA QUANTO AO PRAZO DE ENTREGA – INDENIZAÇÃO DEVIDA A TÍTULO DE LUCROS
CESSANTES –
IMPROVIMENTO DOS EMBARGOS INFRINGENTES.
1.
Deixando a incorporadora de entregar a unidade prometida à venda no prazo
ajustado, responde por indenização, nesta incluídos os lucros cessantes, que
resulta da impossibilidade de o promitente comprador poder auferir renda ou
ocupá-lo em negócio próprio.
2.
Embargos improcedentes. Conhecidos e improvidos os embargos infringentes.
Decisão unânime.
Não
obstante a demora na entrega do imóvel, por vezes os adquirentes ainda devem
suportar a demora na entrega da área comum de lazer do empreendimento. Ora,
compra-se um imóvel, no mais das vezes, pela comodidade que este proporcionará
a seu adquirente.
A área de
lazer destes condomínios é, por vezes, fator determinante na escolha deste ou
daquele empreendimento. A piscina, sauna, salão de jogos, salão de festas,
academia, playground, etc. são ambientes dos quais os adquirentes devem estar
aptos a utilizarem desde o momento em que se imitirem na posse do imóvel.
Porém, a realidade é outra.
Neste
caso, entendemos que o adquirente também faz jus a indenização nos mesmos
moldes daquela prevista para a entrega da unidade habitacional, eis que a
construtora/incorporadora continua em mora.
Outra
espécie de indenização que vem sendo aplicada sistematicamente por nossos
Tribunais é a que consiste na aplicação de multa contratual, muitas vezes
prevista no contrato apenas contra o adquirente, ao vendedor, por força do
princípio da equidade.
É fato
notório termos a estipulação de multas e penalidades de toda sorte contra o
consumidor em caso de inadimplemento e nenhuma contra a
construtora/incorporadora. Pode-se, inclusive, fazer pedidos alternativos em
relação a estes dois parâmetros de indenização, eis que, na maioria das vezes,
se equivalem.
“CIVIL E
PROCESSUAL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. ATRASO NA
ENTREGA DO IMÓVEL. INADIMPLÊNCIA DA CONSTRUTORA RECONHECIDA PELO TRIBUNAL
ESTADUAL. RECURSO ESPECIAL. PROVA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7-STJ.
JUROS MORATÓRIOS, MULTA E HONORÁRIOS. APLICAÇÃO EM CONSONÂNCIA COM A PREVISÃO
CONTRATUAL, POR EQÜIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA DAS PARCELAS A SEREM RESTITUÍDAS.
INCC INCIDENTE ATÉ O AJUIZAMENTO DA AÇÃO, POR VINCULAÇÃO À CONSTRUÇÃO. INPC
APLICÁVEL A PARTIR DE ENTÃO.
I. (...)
II. Multa compensatória, juros e honorários estabelecidos de
conformidade com a previsão contratual, por aplicação da regra penal, a
contrario sensu, por eqüidade.
III.
(...)
V.
Recurso especial conhecido em parte e parcialmente provido.
(...)
Igualmente
sem nenhuma razão a apelante principal quando pleiteia que seja eliminada da
condenação a parcela relativa ao pagamento da multa convencional no percentual
de 0,5% sobre o valor do imóvel, pois, apesar de não existir previsão contratual
desse pagamento em caso de inadimplemento da obrigação por parte da
construtora, a solução encontrada na sentença
monocrática é justa, pois contempla o promissário comprador - reafirmo, parte
mais fraca na relação contratual - com o direito ao recebimento de multa no
mesmo percentual devido à apelante principal se se tratasse de mora do
adquirente do bem.” (...)
(STJ –
Quarta Turma - Recurso Especial Nº 510.472 / MG – Relator: Ministro Aldir
Passarinho Junior – Julgado em 02/03/2004 - DJ 29/03/2004 p. 247 – Grifos
nossos).
Correção do saldo devedor pelo INCC
Outra
situação que onera sobremaneira o consumidor é a cláusula contratual que prevê
a correção do saldo devedor atrelada ao INCC (Índice Nacional de Custo da
Construção), elaborado pela Fundação Getúlio Vargas.
Este
índice tem o condão de compor as perdas das construtoras durante o período em
que o empreendimento está sendo construído. Até este ponto, nada mais justo. O
que ocorre é que, quando a entrega das unidades atrasa, este índice, que deve
ser aplicado durante o período da construção, continua a ser aplicado.
A
aplicação deste índice durante o período de atraso onera ainda mais o
consumidor que, além de não poder contar com seu imóvel, ainda é punido com a
aplicação de índice mais gravoso por fato pelo qual não deu causa nem de
qualquer maneira concorreu.
O que se
pode pleitear em sede de antecipação de tutela é o congelamento do saldo
devedor e a aplicação de índice menos gravoso ao consumidor a contar da data em
que o imóvel deveria ter sido entregue. Caso o imóvel já esteja quitado, cabe o
pedido de restituição em dobro do valor pago indevidamente a título de correção
pelo INCC.
Este tema
ainda é polêmico e encontra resistência em nossos Tribunais, apesar de haver
decisões no sentido de ser possível o congelamento. O Douto Magistrado Fábio
Varlese Hillal da 4ª Vara Cível da comarca de Campinas, ao deferir antecipação
de tutela com o fulcro de suspender a correção do saldo devedor, assim
sustentou sua decisão (proc. n°. 2139/2011):
“O tempo
corre contra o autor, na medida em que, incidindo o INCC até a entrega das
chaves, o saldo devedor aumenta sobremaneira. Não é justo que o autor suporte
esse aumento, sem culpa pela mora na entrega da unidade. Presentes, então, a
fumaça do bom direito e o “periculum in mora”, defiro a tutela antecipada, para
suspender a correção do saldo devedor (que se dá pelo INCC/FGV) [...]” (grifo nosso).
Ilegalidade da cobrança de comissão
Em se
tratando da comissão de corretagem, o tema não encontra muita dificuldade, já
que o entendimento é sedimentado no sentido de que a cobrança é legítima se
houver cláusula contratual especificando a cobrança. Caso o adquirente tenha
efetuado o pagamento, presume-se ter anuído para com aquela cobrança.
No mais
das vezes, entretanto, o que ocorre é que as empresas tentam empurrar este ônus
ao consumidor sem que este perceba. As construtoras/incorporadoras firmam
contratos com imobiliárias que são as responsáveis pelas vendas sem que o
adquirente tenha participado desta relação, ou seja, estas imobiliárias atuam
em benefício das construtoras, devendo estas pagar pelos serviços prestados por
aquelas e não o consumidor.
Neste
caso, por se tratar de cobrança indevida, o adquirente faz jus à devolução em
dobro desta quantia paga, conforme preceitua o artigo 42 parágrafo único do
Código de Defesa do Consumidor:
“Art. 42
– [...]
Parágrafo
único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do
indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de
correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.”
Esse é o
entendimento de nossos Tribunais:
IMÓVEL.
COMISSÃO DE CORRETAGEM. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. Relação de consumo que se
verifica na aquisição de imóvel em loteamento. Abusividade, em tal hipótese, de impor ao consumidor o
pagamento da comissão de corretagem, ônus que se impõe ao fornecedor, porque
tal profissional induvidosamente atua no interesse deste, estando a
comercialização do loteamento ligada ao sucesso do seu empreendimento. Ao
comprador somente pode ser exigida a comissão de corretagem quando contratada
previamente e por escrito, ou seja, quando o profissional é contratado para
encontrar imóvel que preencha determinado perfil, situação absolutamente
diversa da verificada nos autos. Trabalho que deve ser remunerado pela
incorporadora, uma vez que é quem dele se beneficia e que, in casu, não se
desvincula do contrato de promessa de compra e venda firmado. Argumentos trazidos em sede recursal
que não se prestam para alterar o que restou decidido. RECURSO IMPROVIDO.
SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. (Recurso Cível Nº 71000664540,
Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Luiz Antônio Alves
Capra, Julgado em 29/06/2005).(grifo nosso).
Portanto,
deve-se atentar ao contrato. Caso haja cláusula prevendo que a comissão de
corretagem deve ser paga pelo consumidor, a cobrança é legítima se anuido por
este. Caso não haja previsão contratual neste sentido e o consumidor pagar a
comissão, poderá pleitear o reembolso em dobro da quantia paga.
Ilegalidade da taxa SATI
Outra
prática irregular e que as construtoras, valendo-se do desconhecimento dos
consumidores adotam, é a cobrança da chamada taxa SATI (Serviço de Assessoria
Técnico-Imobiliária) cujo valor corresponde a, geralmente, 0,88% sobre o valor
da compra.
Referida
taxa tem por escopo a utilização de serviços de advogado que redigiram e
analisaram o contrato, além de corresponder a outros serviços que não restam
demonstrados de forma clara e precisa. Ademais, o serviço será prestado por
advogados contratados pelas próprias construtoras/incorporadoras que, diga-se
de passagem, defendem os interesses destas.
Essa
cobrança fere não apenas o Código de Defesa do Consumidor como também o Código
de Ética da OAB. Quando contratamos um serviço, nos é assegurada a liberdade de
escolha. As construtoras/incorporadoras não podem interferir nessa liberdade,
sob pena de ter suas estipulações anuladas.
A
contratação desse tipo de serviço deve ser feita em um instrumento apartado
daquele destinado à compra e venda do imóvel. Deve ser um contrato autônomo. Um
instrumento que especificasse o objeto da contratação com clareza e
transparência. Porém, o que se vê na prática é a inserção de uma cláusula no
contrato de compra e venda prevendo este serviço e o pagamento a ser efetuado
pelo adquirente, o que se pode concluir tratar-se da chamada “venda casada”.
‘’O
oferecimento do serviço deve ser claro e preciso, discriminado em contrato
separado, expostas todas as condições de maneira que o contratante tenha
oportunidade de examiná-lo com atenção.’’ Relator: Elcio Trujillo, Apelação Com
Revisão 994040273652 (3673214700), Comarca: São Paulo, Órgão julgador: Quinta
Turma Cível.
Novamente,
o consumidor que se sentir lesado poderá pleitear o ressarcimento deste valor
em dobro, pelos mesmos fundamentos do item anterior e, ainda, com fulcro no
artigo 31 do Código de Defesa do Consumidor que diz:
Artigo 31
- A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações
corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas
características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de
validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam
à saúde e segurança dos consumidores.
Cobrança de IPTU e Condomínio antes da entrega
das chaves
Não se
pode olvidar o fato de que as incorporadoras/construtoras, mesmo antes da
“entrega das chaves”, tentam transferir ao adquirente a obrigação do pagamento
da taxa condominial. Por óbvio que o consumidor não deve aceitar tal encargo já
que o certo seria que as construtoras/incorporadoras arcassem com tais
despesas, mormente pelo fato de que o consumidor não tem, sequer, a posse da
coisa.
Segundo
entendimento da Segunda Seção do STJ, “a efetiva posse do imóvel, com a entrega
das chaves, define o momento a partir do qual surge, para o condômino, a
obrigação de fazer o pagamento do condomínio”. Antes disso, quaisquer despesas
são de responsabilidade de quem tem a posse do imóvel, ou seja, da
construtora/incorporadora. Portanto, é dela que o condomínio deve cobrar as
taxas condominiais (EdResp Nº 489.647, tramitado no Rio de janeiro, julgado em
2009).
A
responsabilidade de custear as despesas de manutenção decorre da possibilidade
de utilização do imóvel e, em muitos casos, há a cobrança sem que o adquirente
tenha se imitido na posse do bem.
Caso haja
a cobrança indevida de taxas condominiais, o adquirente lesado deve procurar o
Juizado Especial Cível munido de documentos que comprovem a data da efetiva
imissão na posse e, caso tenha efetuado o pagamento, pleitear sua devolução em
dobro, por se tratar de pagamento indevido ou, caso contrário, buscar uma
sentença declaratória de inexigibilidade daquela cobrança.
Em se
tratando da cobrança do IPTU, a mesma situação se verifica. As
construtoras/incorporadoras chegam até a realizar a reunião para instalação do
condomínio antes da expedição do habite-se, justamente para se livrarem da
obrigação o quanto antes.
Porém, a
cobrança de IPTU, assim como a cobrança da taxa condominial antes da efetiva
entrega das chaves mostra-se indevida e padece de irregularidades que poderão
ser sanadas pela via do judiciário, caso haja necessidade.
Conclusão
O certo é
que, diante de todas essas irregularidades perpetradas pelas
construtoras/incorporadoras, encontra-se o consumidor que, apesar de adquirir
imóvel de alto valor, não tem sua capacidade econômica equivalente à dessas
organizações e, portanto, são hipossuficientes nesta relação.
Importante
ressaltar a necessidade de documentar todas as negociações e tratativas com
essas empresas, desde e-mails trocados e quaisquer outros tipos de
correspondência que eventualmente poderão servir como prova em uma ação.
O caminho
é árduo, porém, o adquirente tem uma importante e eficaz ferramenta a seu
dispor, qual seja, o Código de Defesa do Consumidor, cuja finalidade precípua é
equilibrar tais relações contratuais maculadas com cláusulas abusivas e
iníquas.
Este artigo
tem o condão de elucidar, em consonância com o posicionamento doutrinário e
jurisprudencial, questões afetas a este tipo específico de negociação. Não se
pretende, de forma alguma, ilustrar direitos de maneira absoluta, até mesmo
porque para a configuração deste direito há a necessidade de provas neste
sentido, o que varia de acordo com o caso concreto.
Destarte,
para evitar estes e outros tipos de dissabores e aborrecimentos, a solução
recomendada seria consultar-se com um advogado de sua confiança antes de
assinar qualquer contrato, especialmente os de alto valor como os que envolvem
a compra e venda de imóveis.
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dos prejudicados nas construções civis que busca a melhoria do setor para se
evitar atrasos de entrega e abusos das empresas.
Desta forma pretendemos disseminar informações
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abusos encontrados contamos com parceria junto a escritórios jurídicos
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